Apesar da diversidade ser cada vez mais celebrada nas empresas, pessoas com autismo continuam enfrentando barreiras invisíveis que impactam sua saúde mental. Psiquiatra autista e com TDAH explica por que inclusão não é só contratação.
Mesmo com avanços na pauta da diversidade, a inclusão de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no mercado de trabalho ainda é cheia de lacunas. Segundo levantamento da consultoria Talento Incluir, apenas 1% das pessoas autistas no Brasil estão empregadas formalmente, enquanto mais de 85% das empresas ainda não sabem como adaptar rotinas e ambientes para acolher essa neurodiversidade.
Para o psiquiatra Dr. Iago Fernandes, que também é autista e tem diagnóstico de TDAH, o problema não está na capacidade das pessoas autistas, mas na estrutura excludente das organizações.
“Muita gente acha que contratar um autista é inclusão. Mas, se essa pessoa precisa mascarar quem ela é, se está constantemente esgotada por excesso de estímulos ou se vive em silêncio por medo de parecer ‘estranha’, isso é só um novo tipo de exclusão — agora com crachá”, afirma.
A situação, segundo ele, é agravada por microviolências cotidianas como interrupções constantes, ambientes barulhentos, reuniões improvisadas e a falta de instruções claras.
“O cérebro autista funciona de forma diferente. A gente precisa de previsibilidade, clareza e respeito aos nossos tempos. Isso não é limitação, é apenas uma forma distinta de perceber o mundo”, explica o psiquiatra.
Estudos internacionais também confirmam a sobrecarga emocional sofrida por autistas em ambientes de trabalho não adaptados. Segundo a National Autistic Society, 7 em cada 10 pessoas autistas relatam que o ambiente profissional afeta negativamente sua saúde mental, com relatos frequentes de burnout, ansiedade e depressão.
Mais do que contratar, é preciso transformar.
Para o especialista, a mudança começa com escuta ativa, capacitação da liderança e revisão de processos:
“Autistas não precisam se adaptar ao mundo. O mundo precisa se abrir para outras formas de pensar, sentir e trabalhar.”
O Dr. Iago Fernandes está disponível para entrevistas online ou presenciais sobre o tema, trazendo dados, vivências e orientações práticas para empresas e gestores interessados em construir uma verdadeira cultura de inclusão neurodiversa.
O mascaramento: o custo invisível da inclusão “de fachada”
Uma das práticas mais comuns — e mais perigosas — entre profissionais autistas é o mascaramento social, que consiste em imitar comportamentos considerados “normais” para evitar julgamentos e exclusão. Isso inclui forçar contato visual, rir em momentos socialmente esperados, disfarçar sobrecargas sensoriais e esconder dificuldades de comunicação.
“Mascarar é cansativo. É como atuar em tempo integral. E, quando a empresa normaliza esse tipo de esforço, está dizendo que o autista só será aceito se fingir ser outra pessoa”, alerta o Dr. Iago Fernandes.
Estudos mostram que o mascaramento constante pode estar associado ao aumento de casos de depressão, ansiedade e ideação suicida entre pessoas autistas — especialmente mulheres e pessoas com autismo nível 1 (antigo Asperger), que frequentemente passam despercebidas nos processos seletivos e nos diagnósticos clínicos.
Incluir é ajustar o ambiente, não a pessoa
Na visão do especialista, o maior erro das empresas é esperar que a pessoa autista se encaixe em estruturas tradicionais sem rever o modo como o trabalho é organizado.
“Flexibilizar prazos, permitir pausas sensoriais, oferecer comunicação escrita ao invés de verbal e respeitar o tempo de processamento de informações são medidas simples, mas transformadoras”, explica.
Ele destaca ainda que muitas vezes, basta ouvir a pessoa autista para saber o que pode ser melhorado.
“Não existe uma fórmula universal, porque cada autista é único. Mas toda empresa pode começar com empatia, escuta e disposição para aprender”, conclui.